Manifesto contra o futebol

Soccer Player Dribbling Between DefendersDas muitas coisas que sou grato por não entender, o futebol é a principal. Não falo das regras, mas da relação que 99% da população brasileira (e nesse caso me refiro ao gênero masculino) tem com o esporte.

Meu pai é palmeirense. Mas se você perguntar-lhe quantas vezes o time foi campeão brasileiro, quem é o técnico atual ou contra qual equipe será o próximo jogo, certamente ficará sem respostas. Já minha mãe nutria simpatia pelo Corinthians em sua infância, mas após dar à luz a dois são paulinos (meus irmãos) mudou de time – uma troca que já diz muito sobre seu apreço pelo esporte em questão.

Eu, como a introdução desse manifesto atesta, fui criado por pais que sempre trataram a dita “paixão nacional” como ela deve ser tratada: com desdém. Meus irmãos, ávidos torcedores do São Paulo, provavelmente não compartilham de minha opinião, o que talvez isente meus pais pela minha “má formação” – ao menos de acordo com o status quo brasileiro.

É fato que o desinteresse de meu pai talvez tenha sido o estímulo original para a minha relação – ou não relação – com o futebol. É de se esperar que a figura paterna inicie a prole no culto ao esporte, estimulando seus primeiros pontapés em jogos entre pai e filho e exercendo o fanatismo diante do sofá nos dias de partidas. Não foi o meu caso.

E como você pode concluir, as aulas de educação física do colégio logo se tornaram pesadelos – ainda mais com o aumento da competitividade entre meus colegas a cada ano. Quando obrigado pelo professor a entrar em campo – a contragosto dos demais jogadores, que sabiam o que sucederia -, eu resumia minha participação nada esportiva chutando a bola em qualquer direção – inclusive o gol do meu time.

Mas chega de escrever sobre o meu passado e vamos ao que interessa: o manifesto – que, apesar de soar como uma carta aberta de um grupo radical, não passa de um ponto de vista particular sobre um assunto específico, tratado no mesmo molde do já escrito manifesto contra a bebida.

Para quem não é nativo, saiba que além de falar a língua portuguesa, pessoas nascidas no Brasil já nascem com a obrigação de adotar um time de futebol para torcer. Muitas vezes os próprios parentes já vestem seus bebês com as cores e escudos dos mesmos, sequer permitindo que os pequenos optem por um clube ao adquirir consciência – o que, a meu ver, não ocorreria se eles realmente adquirissem consciência.

Que fique claro que não tenho nada contra a pratica de esportes – muito pelo contrário. Minha opinião vai contra a aura religiosa que o futebol ganhou no Brasil, algo que transcende amizades, parentescos e até romances – e que em muitas ocasiões conduz os envolvidos a atos de vandalismo, desordem pública, violência e até homicídios.

Entre as muitas críticas que faço, ressalto o tempo que as pessoas perdem discutindo sobre o assunto e a identificação que cada uma sente por um símbolo – ou um escudo.

O que leva uma pessoa, um trabalhador, a depositar sua felicidade em um time de futebol? Já somos obrigados a depositar parte de nossa renda e nossa segurança num grupo de pessoas. Então por que escolher irritar-se quando um time perde ou tirar seu carro de garagem para buzinar de alegria em caso de vitória?

E o pior, bradar de peito aberto “ganhamos” após um resultado positivo, quando na verdade só eles – jogadores, técnicos e cartolas – ganharam ($). O torcedor, qualquer que seja o resultado, só perdeu tempo e dinheiro – com fogos, camisas e combustíveis, para citar alguns exemplos.

Os defensores do futebol costumam falar do prazer que sentem ao assisti-lo e discuti-lo. Continuo sem entender, afinal, sinto muito mais prazer em ler um livro do que ver o que acontece quando 22 jogadores se enfrentam. Quando leio, reflito sobre uma ideia exposta em forma de história e ao mesmo tempo me entretenho. Pode-se dizer o mesmo de uma partida de futebol? O que se aprende? Qual o ganho intelectual dessa atividade? Nenhum. Zero.

Depois de ouvir meus argumentos, torcedores costumam apelar para a paixão, dizendo que o amor pelo time e pelo futebol não pode ser explicado, racionalizado… Eles dizem isso esperando que eu concorde. E eu não os decepciono.

Todo esse manifesto tem como alicerce o racional, o discernimento do que é bom ou ruim para uma pessoa. Se o argumento final é o da paixão, perfeito, abro mão de tudo o que disse, afinal, o amor é cego e o apaixonado é capaz das maiores imbecilidades para ficar com a pessoa amada, seja ela chata, feia, mesquinha, ignorante e/ou canalha. E não importa quanto os amigos avisem, ele assim mesmo vai e se entrega. Paixão. Ausência de razão.

Imagino que o brasileiro goste do futebol por se identificar com duas coisas que ele sabe fazer: torcer e delegar responsabilidades. Existe algo mais passivo do que torcer? Você observa e sem fazer nada espera que os outros aconteçam, façam por você. Típico de gente preguiçosa e que prefere delegar responsabilidade ao próximo.

Paulo Francis disse que se o brasileiro gostasse de política como de futebol, teríamos um país melhor. Nesse caso eu concordo.

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Ser um pai bacana pode acabar com o seu filho…

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Manifesto contra a bebida

Manifesto de fato é uma palavra pesada, parece que falo em nome de um grupo organizado com ideias radicais sobre qualquer assunto – no caso, a bebida. Mas por falta de uma palavra melhor – repúdio talvez? – farei uso dela.

Como estou colocando esse texto num espaço público, sinto-me na obrigação de apresentar-me e justificar minha posição para aqueles que, mesmo não me conhecendo, sentirem curiosidade em lê-lo na íntegra.

Em três décadas de existência jamais coloquei uma gota de bebida alcoólica na boca – talvez essa seja a única parte radical desse “manifesto”, ou ao menos assim espero. Sei que é difícil de acreditar que alguém nascido em 1979 jamais tomou um porre na adolescência ou sequer sabe qual é o sabor de uma cerveja ou um vinho, mas o fato é que até hoje encarei meus problemas, inseguranças e dificuldades de cara limpa por opção.

Quando uso a palavra opção, descarto motivos que me “obrigariam” a assumir uma postura abstemia, como sofrer ou testemunhar abusos de um familiar alcoólatra, pertencer a algum culto religioso ou ser diagnosticado com problemas no fígado ou qualquer outro órgão. Não o fiz por nunca ter sentido o ímpeto de fazê-lo.

Talvez, e já me questionei muito quanto a isso, o real motivo seja não ter interesse em tirar meu cérebro do controle, em precisar nocauteá-lo por algumas horas para em sua ausência tomar atitudes que jamais faria sóbrio. Sempre que precisei vencer a timidez o fiz de cara limpa, da mesma forma que cometi diversos erros em minha vida, como me indispor com pessoas pelos motivos errados e transgredir a lei.

O bêbado, a meu ver, sempre utiliza o álcool para justificar atitudes que gostaria de tomar, mas não tem coragem de fazer em sã consciência. Como disse certa vez um de meus professores, parafraseando a tia de um amigo, “a bebida é o saca-rolhas da verdade” – nada mais certo.

Há quem diga que bebe para relaxar, que utiliza o torpor causado pelo efeito do álcool para aguentar um dia ou situação difícil. Esse também nunca foi o meu caso. Existem tantas maneiras de descansar a mente e o corpo, estimulando a produção de substâncias que não anulam o cérebro, como um bom prato de comida ou o próprio ato sexual, que nunca cogitei fazer uso da bebida para relaxar.

Tendo exposto um pouco da minha vida, dou sequência ao oitavo parágrafo desse texto explicando a minha oposição ao uso que as pessoas fazem da bebida. Em primeiro lugar, deixo claro que a meu ver apenas dois tipos de pessoas ficam bêbadas: as fracas e as idiotas.

O fraco é aquele que bebe por não conseguir lidar com uma situação difícil, seja depressão, medo ou insegurança. Já o idiota se embebeda consciente – e inclusive brada de peito cheio que o faz – para experimentar sua idiotia potencializada pelos efeitos do álcool.

Não é preciso fazer uso de pesquisas para saber que a maioria esmagadora dos bêbados do país pertence ao sexo masculino e está entre os 15 e 35 anos – jovens, por assim dizer. Não estou isentando as mulheres ou os adultos, mas esses costumam causar menos destruição do que os adolescentes, que não por acaso é o público alvo do mercado de bebida.

Aliás, é triste e ao mesmo tempo ridículo observar como essa parcela de bêbados costuma associar seus porres a rebeldia, como se o ato de embebedar-se fosse o mais contraventor possível diante do “sistema” – risos. Tudo que o “sistema” precisa para funcionar é que seus jovens gastem seu tempo e dinheiro enchendo a cara. Dessa forma eles não causam problemas – ou ao menos problemas que o “sistema” não sabe contornar, afinal, a polícia está aí para quê?

Tão estúpido quanto o bêbado revolucionário é o boêmio, aquele que utiliza princípios artísticos para justificar seu alcoolismo. É fato que alguns artistas geniais gostavam de tomar porres, mas não foram os porres que fizeram deles artistas geniais, mas a soma de fatores diversos, como talento, estudo e disciplina – a bebida, eu sinto dizer, não teve nada com isso.

Há quem beba por querer repetir comportamentos de outras gerações, tentando viver as loucuras de épocas anteriores a imagem de seus ídolos, e existe também aquela parcela que gosta de beber para testar seus limites, ver o quanto um organismo aguenta antes de sucumbir ao álcool.

Assim como os casos já citados, eles se encaixam no grupo dos idiotas, que invariavelmente se amparam em convenções sociais sem sentido, como a crença de que na juventude é preciso viver ao máximo e testando seus limites – caso contrário você não terá “aproveitado” – e frases de efeito (“eu bebo sim, estou vivendo…”).

Aliás, abrindo espaço para voltar a minha biografia, poucas coisas são mais patéticas do que ouvir pessoas “adultas” se vangloriando de seus anos de “juventude transviada”. Sinceramente não vejo do que se orgulhar se tudo o que uma pessoa fez se resume a uma sequência de atitudes vergonhosas estimuladas pela bebida. Mas como já escrevi, elas compraram a ideia do “aproveitar a vida” e ainda vivem essa ilusão – ninguém quer olhar para trás e assumir que foi um idiota e apenas isso.

Talvez eu devesse me orgulhar de nunca ter bebido, de nunca ter sucumbido a pressões de colegas e campanhas publicitárias – aliás, nunca encontrei as pessoas bem apessoadas das propagandas nos botecos do meu bairro. Mas eu não vejo mérito nenhum, pois não precisei me esforçar para fazê-lo e, se resolvesse me gabar, acabaria taxado de imbecil, afinal, vivo na sociedade que condena e denigre a pessoa que encontra dinheiro e devolve ao dono. Paciência.

Apesar de nunca ter bebido, durante muitos anos convivi com amigos bêbados e banquei a babá na ocasião de seus porres, apaziguando confusões em bares e levando-os em segurança até suas casas – certa vez cheguei a deitar uma amiga em sua cama, descalçá-la, cobri-la com o lençol e, a pedido, ficar conversando com ela – bêbada – até o sono chegar. Isso já não acontece mais. Há alguns anos resolvi abrir mão de todos os bêbados conhecidos, deixando-os a própria sorte, inclusive em casos extremos, como o de violação física – quis beber? Agora aguenta.

Antecipando e talvez evitando um mal entendido, quero deixar claro que não escrevi esse “manifesto” com a intenção de catequizar ninguém. Sou egoísta o bastante para não querer fazer parte do grupo majoritário e suficientemente pessimista para acreditar que a bebida nunca será encarada como o que realmente é.

Porém, se por um acaso alguma coisa nesse texto fez sentido para quem o leu, fico feliz em ajudar. Caso contrário, sinto muito. Ou melhor, não sinto é nada. O dinheiro, os neurônios e quiçá o cu são seus.

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Um pouco de história…

Quando penso em blues o nome Robert Petway é o primeiro que surge em minha mente. Apesar de não ter feito um “pacto com o demônio” como Robert Johnson, sua misteriosa existência sempre instigou minha imaginação, assim como as poucas faixas gravadas que restaram para contar sua história.

Nunca esqueci a primeira vez em que ouvi sua voz seca e lamuriosa. Eu estava voltando para casa de ônibus quando coloquei no discman a coletânea de blues que havia acabado de comprar (When the Sun Goes Down 2: The First Time I Met the Blues). Assim que os primeiros acordes de “Catfish Blues” surgiram eu soube que havia encontrado algo especial.

Ninguém sabe dizer precisamente onde e quando Petway nasceu, mas muitos apontam a região de Yazoo City, Mississippi, por volta de 1908. Lá ele conheceu seu melhor amigo, o também bluesman Tommy McClennan, com quem passou a se apresentar em bares de estrada e outros estabelecimentos do tipo.

Seu principal “sucesso”, se é que posso chamar assim, é a mítica “Catfish Blues”, gravada em 28 de março de 1941 para a Bluebird Records, em Chicago. A influência desta música pode ser medida pela canção “Rollin’ Stone”, de Muddy Waters, que se baseou na letra e estilo de Petway e de quebra serviu de inspiração para o nome da banda Rolling Stones.

Após sua segunda sessão num estúdio de gravação, ocorrida em fevereiro de 1942, Petway desapareceu da história do blues. A última menção a seu respeito veio do bluesman Honeyboy Edwards, dizendo que Robert havia se mudado para o norte e que ninguém que ele conhecesse sabia que fim o músico havia levado.

O único registro visual de Petway é a foto que ilustra essa nota, tirada em 1941. Chama-me muito a atenção o fato dele não posar vestindo paletó e gravata, moda seguida à risca por todos os bluesmans da época, como seu amigo Tommy McClennan, por exemplo.

Mas chega de história e vamos para o que interessa:

“Catfish Blues” – Robert Petway
http://www.document-records.com/mp3/21611.mp3

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Silêncio na tirinha

Quando eu era pequeno, ou melhor, novo, era apaixonado pelos quadrinhos do Angeli. O fato de meu pai desaprovar a leitura da “Chiclete com Banana” só ajudou a despertar meu interesse pelas tirinhas de Bibelô, Rê Bordosa e Bob Cuspe.

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O tempo passou e descobri o trabalho do Laerte. O poder de síntese, o traço direto e o elemento surpresa, sempre regado ao nonsense, garantiram seu lugar num pedestal alto, como um tipo de “santo dos cartunistas”.

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A década de 90 foi dominada por esses dois monstros, e muito do que foi feito dali em diante bebeu do trabalho de ambos. Agora, nos últimos anos, uma nova geração de cartunistas parece ter despertado. E dessa leva, na minha opinião, Rafael Sica é o cara.

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Sica é sem dúvida um dos mestres das tirinhas mudas, onde você lê (ou vê) e chega a ouvir o som na sua cabeça. Recomendo.

Para saber mais: Quadrinho Ordinário

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Comércio informal

E você se pergunta o que sua tia e as amigas fazem durante a tarde…

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Como tudo começou…

A primeira tirinha de Irmão Remígio, um eclesiasta à moda antiga. A culpa é dele:

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